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Importância do compliance em tempos de coronavírus

Foto: Catkin / Pixabay
A área contribui para as empresas no fortalecimento e monitoramento de procedimentos internos durante a crise.

Publicado em 18/06/2020

Com a tendência apontando para a ampliação do home office, as empresas devem reforçar ações de compliance para mitigar riscos no cumprimento de regras de normas e condutas.

 Uma pesquisa online feita pela Robert Half, revela que 86% dos profissionais gostariam de continuar no home office após a quarentena. Outra pesquisa feita pela Cushman & Wakefield diz que para 73,8% das empresas brasileiras, a modalidade será definitiva pós-pandemia de Covid-19.

O compliance visa prevenir eventuais irregularidades que possam vir a afetar o desempenho, os valores e a reputação da empresa no mercado. Manter a empresa em compliance tem como significado atender as normativas dos órgãos reguladores, de acordo com as atividades desenvolvidas pela corporação, bem como dos regulamentos internos e externos.

Neste momento de incertezas, o compliance pode assegurar a sobrevivência da empresa e promover a regularidade da atividade e sua segurança jurídica com a finalidade de avaliar e estabelecer na instituição, regras que atendem critérios legais envolvendo diversas questões, como por exemplo: admissão e demissão; saúde e segurança do trabalho; impactos ambientais; relação interpessoal no ambiente laboral; terceirização de serviços; atendimento ao consumidor, entre outros.

Penha Pereira - Foto: Assessoria
Penha Pereira – Foto: Assessoria

Penha Pereira, economista e gestora de carreira, avalia que a chegada do coronavírus no Brasil, expôs a necessidade de novos formatos de trabalho, gestão de equipes, condução de reuniões previamente marcadas, apresentações, o que até a alguns meses, era uma realidade incipiente na cultura corporativa.

“Devido à necessidade de novas maneiras de se trabalhar, surgiram novos processos, mais enxutos e menos burocráticos. Além disso, outro efeito da pandemia foi a redução nos quadros de colaboradores das corporações, o que resultou na quebra de um dos pilares dos controles e compliance nas empresas, ou seja, a segregação de funções. Esta situação impôs mais um desafio na readequação dos quadros funcionais, sem descumprir as normas”, afirma.

Durante a quarentena, os desafios do compliance têm sido manter seus programas e suas atividades em funcionamento e descobrir como pode atingir colaboradores que estão fisicamente longe do escritório, pois seja com códigos ou políticas, formulários, procedimentos e relatórios, a gestão deles costuma ser física e presencial. Hoje, com a transformação digital já é possível encontrar no mercado softwares específicos para a área.

Marcos Assi - Foto: Assessoria
Marcos Assi – Foto: Assessoria

Para Marcos Assi, especialista em compliance, riscos e governança corporativa, o momento atual requer das organizações vigilância e atenção aos processos, sistemas e controles, mas principalmente no cuidado com as pessoas. “Cuidar do maior bem da organização e proporcionar condições para que consigam desempenhar suas atividades com segurança, preservando a saúde individual dos empregados e familiares é de suma importância. Adicionalmente treinar, educar e conscientizar as pessoas sobre estes riscos, promovendo um fluxo de informações transparente e confiável. Da mesma forma, dedicar atenção para seus clientes, fornecedores e demais stakeholders garantindo a continuidade dos negócios e visando o bem-estar da comunidade em que a empresa está inserida”, afirma.

Ele enfatiza que as atividades de compliance em TI, devem receber atenção especial e precisam se adaptar aos desafios que devem surgir. “Sabemos que isto vai depender muito da estrutura organizacional, porte e cultura interna de cada empresa, mas independente disto cabe ao compliance em TI, em conjunto com a gestão área, assegurar e apoiar a administração da organização. As companhias devem buscar cada vez mais medidas para assegurar o cumprimento das legislações que tratam de ética no âmbito empresarial e laboral”, complementa.

Gerd Altmann – Foto: Pixabay

Contribuição para nortear as empresas após a pandemia

Nos últimos anos, o compliance vem ganhando força no Brasil, sobretudo a partir de 2013, quando foi sancionada a Lei n° 12.846, também conhecida como Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa, regulamentada pelo Decreto n° 8.420/2015. A Lei responsabiliza objetivamente, no âmbito civil e administrativo, as empresas que praticam atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira. A multa administrativa prevista na Lei é alta, e pode chegar até a 20% do faturamento bruto anual da empresa, ou até 60 milhões de reais, em alguns casos.

Na esfera judicial, pode ser aplicada até mesmo a dissolução compulsória da pessoa jurídica. O texto da referida Lei também prevê uma redução da pena para a empresa infratora que colaborar com o poder público e comprovar ter mecanismos para inibir fraudes. Por isso, é preciso que a empresa, os gestores e também os colaboradores se atentem em se adequarem às políticas, regras, controles internos e externos que regem sua atividade.

Manuais de conduta e boas práticas são algumas das ferramentas que a empresa pode adotar para mostrar para fornecedores, investidores e clientes que atua com transparência e ética, gerando ainda mais valor para sua marca.

As mudanças causadas pela pandemia, terão impacto na forma de trabalhar das pessoas.  Hoje, alguns dos desafios das empresas são: promover uma melhoria das relações entre os funcionários, a gestão da companhia, e aumentar a produtividade da equipe.

Marcos Assi, prevê que os impactos para as empresas que já tinham iniciado a jornada na era digital, provavelmente serão menores quanto ao uso de novas tecnologias, mas lembra que não é a realidade da maioria das empresas brasileiras. “A crise atual tem proporcionado uma aceleração, que fez com que as empresas fossem obrigadas a colocar seus empregados trabalhando em home office, tendo que buscar novos canais e formas de chegar a seus clientes, fornecedores e parceiros comerciais. As novas formas e canais digitais em uso, que precisam ser implantadas para manter a continuidade dos negócios, também podem trazer riscos relacionados, não só a conformidade com as leis, mas também riscos de segurança de informação e proteção de dados. Avaliar estes riscos e trabalhar junto as áreas de segurança da informação para implementar ações e controles mitigatórios são primordiais para o momento atual”, analisa.

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Mudanças causadas pela pandemia também afetam o compliance

O home office deverá afetar todas as áreas da empresa e com as áreas de compliance, não será diferente.

Luiz Marcatti - Foto: Assessoria
Luiz Marcatti – Foto: Assessoria

Luiz Marcatti, CEO da MESA Corporate Governance, acredita que esse formato de trabalho é um desafio relevantepara as regras e as práticas de compliance, pois o colaborador não estará em um ambiente que se imagina controlado, como acontece na empresa. “Será imprescindível uma ampla revisão nas regras do compliance, incorporando questões que envolvem a particularidade das residências. Um caminho que já começa a ser trilhado é a empresa fornecer equipamentos como computador, impressora e acessos à internet, com sistemas antivírus, firewall e Wi-Fi controlados pela área de segurança nas empresas. Além, é claro, de treinamentos, comunicação e indicadores que permitam a gestão do trabalho remoto”, comenta.

“Os indicadores de performance deverão representar uma forma de avaliar se as metas, a eficiência e a eficácia estão sendo realizadas. As regras deverão ser repensadas e implementadas, e devemos avaliar um modelo em que não teremos as pessoas presencialmente, mas de forma virtual, mas os trabalhos deverão ser realizados mesmo a distância, vai mudar a forma de prestação de contas, afinal há muito tempo ouvimos o termo disruptivo, chegou a hora de implementar”, avalia Marcos Assi.

A pandemia de covid-19 também terá impacto no gerenciamento de programas de compliance na área de recursos humanos. Na opinião de Marco Assi, os grandes impactos serão ocasionados justamente a legislação trabalhista que está longe da realidade atual.

“Basta avaliar as questões do home office, que na legislação trata como teletrabalho, observe, por exemplo, a dificuldade do tratamento das funções existentes na área de tecnologia da informação na nossa CLT, e como a Covid-19 trouxe essa nova realidade, surgiu a necessidade das empresas se adaptarem, demandando maior conhecimento em diversas áreas para garantir a sobrevivência da organização em um mercado cada vez mais imprevisível”, analisa.

Para o especialista, em tempos de pandemia, o programa de compliance deve avaliar a saúde de todos os envolvidos e requer diversos investimentos. “Há colaboradores que podem executar suas atividades em home office e há cargos essenciais que devem ser mantidos dentro das empresas. Para os afastados e os que estão em home office, a empresa deve realizar o acompanhamento, mesmo que a distância, para verificar o cumprimento das exigências e orientações da medicina; e para os presenciais, onde o risco é maior, existe o investimento em distribuição de álcool, máscaras, medidas de distanciamento, ações para evitar o uso de transporte público para os colaboradores se locomoverem, adequação do local de trabalho para isolar e proteger”, avalia.

“Acredito que as políticas de gestão de pessoas terão de ser revistas também. Inclusive, por causa de possíveis liabilities (obrigações) relacionadas a carga horária de trabalho, respeito a horários de almoço, descanso, hora extra, entre outros. A partir da revisão das políticas de compliance, com apoio de parecer jurídico, é importante desenvolver comunicação e treinamento, inclusive para a liderança estar preparada para esta nova forma de gerir seu time”, complementa Luiz Marcatti.

As empresas que possuem área de compliance, foram menos impactadas ao se ver diante da realidade do trabalho remoto, já as que não contam com programas internos de continuidade dos negócios em situação de crise correm o risco de fechar, como explica Marco Assi.

 “Algumas empresas que não possuem programas que atendem a necessidade do negócio, por falta de um programa de compliance, controles internos e riscos adequados e bem avaliados e próximos ao modelo negócio, sofreram muito e algumas podem até fechar. Portanto, o recado é para que estas empresas, busquem a revisão dos processos e repensem uma forma de trabalho que atenda sua necessidade, que seja sustentável para que não sejam surpreendidos a toda crise que apareça. Todas as corporações, em menor ou maior grau, foram atingidas pela crise gerada pela pandemia, mesmo aquelas que possuíam os planos de continuidade de negócios, comitês de crise e o risk assessment atualizados, provavelmente não tinham previsto impactos da grandeza que estamos enfrentando. Na situação da pandemia, dentro da abrangência do compliance de TI, as principais preocupações foram de avaliar o uso de novas tecnologias, segurança dos dados, política de controle de acessos e nos riscos de fraudes cibernéticas”,  acrescenta Marcos Assi.

Penha Pereira enfatiza que é perceptível um cenário que pode gerar grandes brechas para a ocorrência de atividades ilícitas, e da mesma forma que os modelos de trabalho mudaram, e será radicalmente difícil retornar ao modelo antigo, por uma série de motivos, faz-se necessário uma revisão na forma de se trabalhar em compliance, visto que a luta contra a falta de ética não poderá deixar de existir nunca.

“A figura do Triângulo de Cressey (o triângulo da fraude), mostra claramente o potencial de risco trazido pela modalidade home office: a pressão, que é a existência de problemas financeiros que não podem ser compartilhados; a oportunidade, que é possibilidade de solucionar, secretamente esses problemas, pela violação de um demonstrativo financeiro; e a racionalização, é a ideia de que é necessário e se justifica a fraude, para que se resolva o problema financeiro da empresa. As áreas de compliance devem estar conectadas com o novo trabalho, criando novas políticas e novos códigos de ética, ensinando aos profissionais de forma interativa e eficaz, sem engessar o negócio”, conclui.

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